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Vídeos e dancinhas no TikTok geram demissão por justa causa?

Confira as consequências possíveis em casos de gravação de conteúdo utilizando uniforme, em ambiente e horário de trabalho.

Com a popularização do TikTok, outra coisa também aumentou: as demissões por justa causa por postagem de dancinhas e vídeos no aplicativo. Um dos acontecimentos recentes é o de uma estagiária, que foi desligada depois de gravar um vídeo dançando funk com letra de conotação sexual.

Ocorre que a estagiária estava uniformizada e com crachá da Prefeitura de São Francisco do Sul (SC), local em que trabalhava. O embasamento jurídico para demissões desse tipo está no artigo 482 da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), que elenca as situações que autorizam justa causa.

Os vídeos no TikTok podem ser vistos como “ato lesivo da honra ou da boa fama” contra o empregador, superiores hierárquicos e qualquer pessoa, conforme dois advogados trabalhistas ao site UOL.

Qualquer gravação no TikTok é motivo para justa causa?

Conforme o entendimento de Thomas Steppe, advogado do escritório Demóstenes Pinto Advogados, localizado em Porto Alegre (RS), existem situações que podem atenuar o caso, bem como existem aquelas que podem agravar. Segundo Steppe:

“Fazer o vídeo uniformizado é mais sério, porque na verdade o funcionário está no ambiente de trabalho e representando a empresa. Se está no posto de trabalho dele, como um porteiro de prédio ou dentro de um supermercado, é um agravante. Quando o funcionário está fora do horário do trabalho dele, e dentro de outra circunstância, pode ser um atenuante. Tudo é uma questão de interpretação”.

Quais tipos de conteúdo levam à demissão?

É preciso analisar alguns aspectos para que seja verificada a demissão por justa causa com base em conteúdo postado no TikTok. Segundo o advogado Decio Daidone Júnior, sócio do Barcellos Tucunduva Advogados:

“O que vai ser analisado é se teve qualquer conteúdo ilegal, que incite ao crime, que seja grosseiro, ofensivo, que tenha cunho calunioso, que seja abusivo, ou que possa invadir privacidade de alguém, algo obsceno, pornográfico, que seja preconceituoso, que exponha negativamente a marca da empresa, que traga algum prejuízo à identidade da empresa. Tudo que gere prejuízo à marca ou reputação pode ser considerado irregular”.

Quais são as punições?

A empresa pode mais do que só demitir o funcionário. Sendo que pode ser aplicada suspensão entre 1 e 30 dias, ou advertência, dependendo do caso concreto. Conforme Daidone Júnior, funciona como uma gradação da pena, sendo necessário que a empresa atue com proporcionalidade e razoabilidade.

Por exemplo, caso o vídeo não seja muito danoso à empresa, é possível advertir o funcionário por escrito, ou até suspendê-lo. Já se o vídeo causar muito prejuízo a demissão direta por justa causa é uma opção.

Entretanto, é importante ressaltar que não existe nada na lei que obrigue a empresa a atuar conforme essa gradação. Sendo que a demissão pode ser realizada imediatamente.

Confira duas decisões judiciais que reverteram a demissão

Sem conotação de desrespeito com a função exercida ou com o nome da empresa

Nesse processo, o funcionário postou vídeos em seu posto de trabalho, utilizando uniforme, o que levou a empresa a demiti-lo por justa causa. Entretanto, a decisão reverteu esse tipo de demissão.

Segundo fundamentado pelos desembargadores, uma “breve ‘dancinha’ uniformizado não é capaz de macular a imagem”, visto que “não contém qualquer conotação de desrespeito com a função exercida ou com o nome da empresa”.

Não associou o vídeo à empresa

Nesse caso, a demissão da funcionária se deu após a postagem de um vídeo no TikTok, no qual faz uma dancinha de dez segundos “em traje comum e em ambiente com fundo branco”, de acordo com uma parte da ação.

No decorrer do vídeo, aparecem efeitos visuais acompanhados das frases: “Alerta de gatilho”; “Trabalho há 10 anos na mesma empresa”; “Me chamam de incompetente”; e “Mas não demitem a incompetente NEM A PAU”.

Na fundamentação do Juíz Ronaldo Luis de Oliveira, não existiam elementos suficientes para fazer a relação da funcionária e do vídeo com a empresa. Segue trecho expresso pelo magistrado:

“Ainda que o comportamento reproduzido no vídeo, praticado pela autora, possua questionável sensatez (fruto, aliás, do uso indiscriminado de redes sociais na internet, gerando situações que beiram a bizarrice e a falta de razoabilidade, como aquela apresentada neste feito), é certo que referida mídia não indica, em seu conteúdo, qualquer menção expressa ao fato de que a reclamante, àquela época, fosse empregada da reclamada”.

Considera ainda Oliveira que não existem mais provas — além do próprio vídeo — para concluir que a empregada tentou ofender algum dos representantes legais ou a própria empresa.

Para finalizar, o Juiz ainda considerou que a empresa simplesmente “presumiu” que o vídeo era direcionado a ela “não se empenhando em apurar devidamente a situação apresentada”. Após a fundamentação, julgou que a penalidade máxima da CLT não deveria ser aplicada no caso em tela, anulando o desligamento.

Duas decisões favoráveis à empresa

Funcionárias que gravaram dancinha no necrotério

No dia 14 de novembro de 2021, funcionárias gravaram um vídeo dançando em frente ao necrotério do hospital que trabalhavam, sem usar máscaras, em plena pandemia de Covid-19.

As funcionárias alegaram que o vídeo foi gravado enquanto comemoravam um aniversário. Uma das funcionárias, buscou amparo judicial para reverter a demissão. Mas a justa causa foi mantida pela Juíza do trabalho, Marcia Sayori Ishirugi.

No decorrer do processo, uma das superiores da requerente alegou que a demissão se deu por “mau comportamento”, alegando que a mulher tinha status de líder de equipe.

A chefe da mulher informou que não se tratava de uma brincadeira inocente, tendo em vista que “a prestação de serviços se dava em um hospital, onde havia ocorrência de incontáveis óbitos, demonstrando, portanto, total desrespeito com os pacientes e seus familiares e, consequentemente, com o seu cliente, o hospital”.

Na conclusão feita pela Juíza, a dança realizada e gravada próxima ao necrotério do hospital “não é uma conduta adequada para trabalhadores de um hospital, ainda mais durante uma pandemia que está gerando inúmeros óbitos”.

Funcionários simulando sexo no trabalho

Por fim, funcionários durante expediente simularam situações sexuais no local de trabalho. A funcionária que foi desligada buscou na Justiça a reversão da justa causa.

Conforme observado pelos desembargadores, não houve contestação de que os vídeos foram gravados com o celular da funcionária, bem como ela não questionou a veracidade dos fatos.

Por meio de marca d’água encontrada no vídeo em questão, os magistrados conseguiram comprovar que os vídeos foram produzidos no celular dela, bem como postado em rede social. Conforme os magistrados, a funcionária conhecia os atos, e os incentivava ao emprestar seu celular para as gravações.

“Dessa maneira, fica evidente a gravidade do ato praticado pela autora, agindo corretamente a ré na aplicação da justa causa”, ressaltam os desembargadores. Assim, depois de todo o exposto, a demissão por justa causa também não foi revertida neste caso.

Imagem: BAZA Production / Shutterstock.com