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Super-ricos escapam da carga do IR e pagam menos que a classe média, diz estudo

A desigualdade tributária no Brasil voltou ao centro do debate após a divulgação de um estudo que revela como os super-ricos pagam proporcionalmente menos Imposto de Renda do que trabalhadores da classe média. Os dados, levantados pelo Sindifisco Nacional, mostram que essa distorção vem se aprofundando nos últimos anos, ampliando a sensação de injustiça fiscal no país.

Segundo os auditores fiscais da Receita Federal, a queda na tributação das camadas mais altas de renda está diretamente ligada à isenção de dividendos, que beneficia quem recebe lucros distribuídos por empresas. Enquanto isso, a defasagem da tabela do IR penaliza cada vez mais os contribuintes de rendas intermediárias, pressionando principalmente quem vive de salário.

Bolsa Família imposto super-ricos
Imagem: Khongtham / shutterstock.com

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Como os super-ricos pagam menos imposto que a classe média

O cálculo da alíquota efetiva

A análise feita pelo Sindifisco considera a chamada alíquota efetiva, que representa o percentual da renda realmente comprometida com o Imposto de Renda. Para ilustrar, alguém que ganha R$ 200 mil em um ano e paga R$ 20 mil de imposto tem uma alíquota efetiva de 10%. Já quem recebe R$ 6 milhões e paga R$ 300 mil, contribui com apenas 5% da própria renda.

Em 2023, contribuintes com ganhos acima de 320 salários mínimos mensais, o que equivale a cerca de R$ 5 milhões ao ano, pagaram uma alíquota média de apenas 4,34%. Já os que recebem entre 5 e 30 salários mínimos foram tributados em média em 9,85%, ou seja, mais do que o dobro da carga aplicada sobre os mais ricos.

A mudança ao longo dos anos

Os dados históricos indicam que em 2007 os super-ricos pagavam até mais imposto proporcionalmente que a classe média. Naquele período, a alíquota efetiva média era de 6,9% para os milionários e 6,3% para quem recebia entre 5 e 30 salários mínimos. A diferença só começou a se inverter a partir de 2009, com o congelamento da tabela e a crescente fatia de renda isenta.

Por que a desigualdade tributária aumentou

O peso dos dividendos

Desde 1996, dividendos distribuídos a acionistas não são tributados no Brasil. Isso significa que uma parcela significativa da renda dos super-ricos não sofre desconto algum de Imposto de Renda. Como esse tipo de ganho cresceu nos últimos anos, especialmente após a pandemia, a distância em relação à classe média se tornou ainda maior.

Dados do Sindifisco mostram que, entre 2020 e 2023, a renda de lucros e dividendos aumentou 43%, enquanto a renda total cresceu 31%. Esse movimento fez com que a parte isenta da renda dos milionários tivesse um crescimento mais acelerado que a média nacional.

O congelamento da tabela do IR

Enquanto os super-ricos se beneficiaram da renda isenta, trabalhadores assalariados sofreram com a falta de correção da tabela do Imposto de Renda. Sem atualização pela inflação, os reajustes salariais, mesmo modestos, empurraram milhões de brasileiros para faixas de tributação mais altas. Assim, a classe média passou a contribuir proporcionalmente mais, apesar de não ter ganho real de poder de compra.

A proposta do governo Lula para reequilibrar a tributação

Ampliação da faixa de isenção

O governo Lula propôs ampliar a faixa de isenção para rendas de até R$ 5 mil mensais, o que deve beneficiar trabalhadores de baixa e média renda. Hoje, a isenção prática já alcança quem ganha até dois salários mínimos, cerca de R$ 3 mil, mas a atualização ampliaria o alcance da medida.

Criação do imposto mínimo para os mais ricos

Outro ponto central da proposta é a criação de um imposto mínimo de até 10% para quem recebe rendimentos elevados. Pela proposta, quem tiver ganhos anuais superiores a R$ 1,2 milhão e pagar menos do que a alíquota mínima deverá complementar a diferença no ajuste anual do IR.

A expectativa é que, com essa medida, milionários passem a contribuir com percentuais mais próximos da classe média, reduzindo parcialmente a distorção. Ainda assim, o Sindifisco defende que o percentual deveria ser maior, chegando a 15% para cobrir a desoneração dos grupos intermediários.

Impactos esperados da reforma

Alívio para rendas mais baixas

Se aprovada, a proposta reduzirá significativamente a carga tributária de quem ganha até cinco salários mínimos, atualmente tributado em média em 2,66%. O alívio seria importante para um grupo que viu sua alíquota efetiva aumentar doze vezes desde 2007.

Maior cobrança dos milionários

Ao mesmo tempo, os super-ricos passariam a pagar mais, ainda que em proporção menor do que o ideal defendido pelos auditores fiscais. A medida ajudaria a interromper a tendência de queda no imposto efetivo pago por quem tem rendas milionárias.

As críticas ao modelo atual

Um sistema regressivo

Especialistas consideram o sistema tributário brasileiro regressivo, ou seja, mais pesado proporcionalmente para os mais pobres e para a classe média do que para os milionários. Essa característica contribui para a perpetuação da desigualdade social no país.

Dependência de tributos sobre consumo

Além da desigualdade no IR, o Brasil depende fortemente de tributos sobre o consumo, que penalizam proporcionalmente quem ganha menos. Assim, mesmo que a reforma avance, ainda há a necessidade de mudanças estruturais mais amplas para que o sistema seja de fato progressivo.

O futuro da tributação no Brasil

Com a reforma em debate no Congresso, há expectativa de mudanças significativas nos próximos anos. A inclusão de um imposto mínimo para os mais ricos pode representar uma virada de página, mas a resistência política é grande. Bancadas empresariais e grupos de pressão já se mobilizam para frear ou suavizar as mudanças propostas.

Por outro lado, a pressão da sociedade por maior justiça fiscal tende a crescer, principalmente diante de dados que mostram que trabalhadores assalariados arcam com um peso desproporcional. O desafio do governo será equilibrar arrecadação, competitividade econômica e redução das desigualdades.

Imposto de Renda/restituição IR
Imagem: Freepik e Canva

O estudo do Sindifisco expõe de forma clara como os super-ricos escaparam ao longo dos anos de uma carga tributária proporcional, transferindo parte desse peso para a classe média. O congelamento da tabela do IR e a isenção dos dividendos criaram uma distorção que coloca em xeque a noção de justiça fiscal no Brasil.

A proposta de reforma apresentada pelo governo Lula busca corrigir parte desse problema, ampliando a isenção para rendas mais baixas e cobrando um mínimo dos mais ricos. Embora não resolva todos os desequilíbrios, o projeto pode representar um avanço importante em direção a um sistema tributário mais progressivo.

O futuro do imposto de renda no Brasil dependerá da capacidade de conciliar interesses econômicos e sociais. Se as mudanças forem aprovadas, o país pode dar um passo relevante para reduzir desigualdades históricas e construir um modelo de arrecadação mais justo.