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Conheça a Lojas Americanas e as causas de sua crise

Entenda o que aconteceu com a varejista, sua história, maiores acionistas e principais números

A varejista Lojas Americanas é uma das mais importantes do país, mas se viu às voltas de uma grande polêmica no início de 2023. Tendo como maiores acionistas os homens mais ricos do Brasil, a empresa apresentou problemas em sua contabilidade.

Como resultado, suas operações foram amplamente afetadas e investidores perderam milhões de reais com a fraude. Em meio a isso, a Lojas Americanas entrou em recuperação judicial, comprometendo seu futuro. 

Saiba neste artigo o que foi a crise instaurada na varejista, a importância da empresa para o mercado e o que esperar da empresa. Confira!

A história de Lojas Americanas

A criação da Lojas Americanas foi no ano de 1929, fundada pelos americanos John Lee, Glen Matson, James Marshall e Batson Borger, além do austríaco Max Landesmann. Ambos eram ex-funcionários da rede de lojas dos EUA Woolworth.

Essa empresa ficou famosa por conta dos itens vendidos, por preços bem acessíveis. Conforme a Lojas Americanas, a inspiração vinha do bordão: “Five and Ten Cents”; traduzindo, seria algo como preço entre “5 e 10 centavos de dólar”, da época.

Com esse modelo na cabeça, os executivos partiram em direção à América do Sul, mas, inicialmente, a ideia era se estabelecer em Buenos Aires, na Argentina, e não no Brasil. Isso mudou quando, no meio do caminho, atracaram no Rio de Janeiro. 

Em terras brasileiras, conheceram Aquino Sales, brasileiro, e Max Landesman, austríaco. Foi nessa ocasião que os americanos conheceram as oportunidades existentes, na então capital federal. 

“Na época, a população da cidade carioca era formada principalmente por profissionais com renda estável e salários não tão altos, e a maioria das lojas não atendia essas necessidades, já que a maioria vendia produtos caros e muitos específicos”, segundo informações da história da empresa.

Início das operações

Dessa forma, após poucos meses estabelecidos no Rio, iniciaram as atividades da Lojas Americanas, com sua primeira unidade em Niterói (RJ). O slogan inicial era “Nada além de 2 mil réis”.

Para alavancar os negócios, a varejista contrata mulheres, com o objetivo de atrair o público das donas de casa. Essa estratégia foi considerada pioneira e diferenciada. Ao final de 1929, contava com 3 unidades no Rio de Janeiro e 1 em São Paulo.

Como forma de poder expandir as operações, replicando o modelo amplamente usado nos EUA de capitalização de empresas, a Lojas Americanas lançou ações na bolsa de valores, em 1940. Assim, teve dinheiro para abrir mais lojas e expandir a marca.

Entrada dos maiores acionistas 

Um novo capítulo da empresa começou em 1982. Nessa época, os empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira compraram o controle da Lojas Americanas.

O trio era dono – quando assumiu a Lojas Americanas – do Banco Garantia, instituição que era uma corretora, no início dos anos 70. A instituição foi fundada por Lemann (no centro da foto abaixo), tendo Telles (à direita) e Sicupira (à esquerda) tornados sócios ao longo daquela década.

Os três maiores acionistas da Americanas e sócios da 3G Capital, Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira
Imagem: Reprodução/3G Capital

Por trás do modelo de gestão, que é replicado até os dias de hoje, inclusive com outras empresas do trio – como a AmBev, dona das marcas de cerveja Brahma, Antártica e Skol –, estava o conceito de corte de custos, agressividade comercial e meritocracia (quando as pessoas mais dedicadas, com os melhores resultados, são mais remuneradas com bônus salariais, estimulando a competição interna).

Bilionários

Ao longo do tempo, enquanto construíam resultados positivos para Lojas Americanas e AmBev, os empresários passaram a fazer diversas outras compras de empresas pelo mundo.

A própria AmBev, que foi resultado da fusão das marcas Brahma (de 1888) e Antártica (de 1885) – concentrando boa parte do mercado brasileiro de cervejas –, acabou se tornando ainda maior. 

Em 2004, a AmBev se fundiu com a cervejaria belga Interbrew, em um negócio, na época, de US$ 11 bilhões, equivalente, atualmente, a mais de R$ 50 bilhões, criando a InBev. Pouco depois, outra importante marca foi adquirida, a Budweiser. Atualmente, o faturamento anual da InBev é de US$ 57,7 bilhões, quase R$ 300 bilhões.

Fora esse negócio, outras empresas adquiridas foram o Burger King, rede de lanches rápidos, e a Kraft-Heinz, conhecida pela fabricação de ketchup, entre outros produtos alimentícios.

Não por acaso que o trio está no topo dos maiores bilionários brasileiros. Ambos concentram o grosso dos seus negócios na 3G Capital.

Veja abaixo o valor da fortuna dos empresários, conforme levantamento da Forbes, do início do ano, portanto, antes da crise envolvendo a Americanas:

  • 1º Jorge Paulo Lemann: US$ 16,1 bilhões (R$ 82 bilhões);
  • 2º Marcel Herrmann Telles: US$ 10,8 bilhões (R$ 55 bilhões);
  • 3º Carlos Alberto Sicupira: US$ 8,8 bilhões (R$ 45 bilhões)

Crise na Lojas Americanas

Dito tudo isso, você leitor deve estar se perguntando, como pode ser que a Lojas Americanas esteja à beira do colapso tendo por trás empresários tão bem sucedidos?

Algumas pistas estão no modelo de negócio, voltado à pressão por resultados. 

Afinal, a crise está, basicamente, na contabilidade da empresa, que foi, digamos assim, “maquiada”.

Oficialmente, a crise começou no dia 11 de janeiro, quando a empresa informou sobre a existência de “inconsistências contábeis”, ao longo dos últimos anos, no lançamento de valores para fornecedores.

“Numa análise preliminar”, no início do ano, essas “inconsistências” somavam cerca de R$ 20 bilhões. Não demorou muito, a Lojas Americanas logo pediu recuperação judicial, que é um passo anterior à falência. 

Recuperação judicial

Durante uma recuperação judicial, as empresas, como um todo, tentam renegociar suas dívidas com os credores, buscando maiores prazos para pagamentos, assim como descontos.

No caso da Lojas Americanas, logo após decretar a recuperação judicial, saiu a lista dos credores e um novo susto. O valor da dívida divulgada era maior: superior a R$ 40 bilhões, distribuídos entre 9,6 mil credores.

Assim começou um processo de tentativa de negociação com os maiores credores, entre eles alguns dos maiores bancos do país, com destaque para Bradesco (R$ 4,8 bilhões em dívidas), Santander (R$ 3,6 bilhões), BTG (R$ 3,5 bilhões) e Itaú (R$ 2,9 bilhões).

“Risco sacado”

Para saber exatamente o que aconteceu é preciso entender um pouco da natureza de suas operações. Como a Lojas Americanas trabalha com inúmeros fornecedores, ela faz uso do chamado “risco sacado” – “forfait”.

Isso nada mais é do que uma operação de antecipação de recebíveis (valores), realizada por grandes empresas, com seus fornecedores. Assim, muitas vezes, os fornecedores antecipam seus recebimentos de 30, 90 ou até 180 dias.

Esse valor antecipado aos fornecedores, feito pelos bancos, vira uma dívida para as grandes empresas, como a Lojas Americanas, que fazem uso desse mecanismo.

Aí é que começou o problema. Ao longo dos anos, a empresa subestimou esses valores no balanço, deixando de lançar os juros a serem contabilizados nas dívidas com bancos. 

O “problema” acabou sendo detectado pelo novo presidente da empresa, Sergio Rial, que assumiu a Lojas Americanas no início de 2023, tendo ficado apenas dez dias na função. 

Após denunciar o “rombo” bilionário, ele pediu a renúncia do cargo – e a empresa entrou em colapso.

Valor das ações

Como era de se esperar, todo esse escândalo gerou graves consequências, não só para a Lojas Americanas, como para todo o setor, e uma cadeia imensa de fornecedores e bancos.

Especialmente a Lojas Americanas perdeu quase 90% de seu valor de mercado. Como se vê no gráfico abaixo do valor de suas ações.

Fonte: Google

Em poucos dias, as ações da Americanas caíram de R$ 12 para menos de R$ 1. Veja a simulação do prejuízo dos investidores:

  • Quem tinha 100 ações, que valiam R$ 1,2 mil, viu seu patrimônio cair para R$ 100 (R$ -R$ 1,1 mil);
  • Quem tinha 10.000 ações, que valiam R$ 120 mil, perdeu cerca de R$ 110 mil, para R$ 10 mil;
  • Já quem tinha 1 milhão de ações, ao preço de R$ 12 milhões, perdeu cerca de R$ 11 milhões, pois seus papéis caíram ao valor de R$ 1 milhão.

Para se ter uma ideia da crise, diversos mercados foram impactados. Os custos de crédito às empresas subiram, assim como houve perdas em detentores de outros títulos, como de debêntures.

Números da Lojas Americanas

Ainda não se sabe exatamente o tamanho do buraco causado à varejista, mas com certeza gerou grandes perdas. De uma das líderes do setor, a empresa vai diminuir de tamanho – e muito.

No último balanço divulgado, referente aos nove primeiros meses de 2022, a companhia tinha um faturamento total de R$ 39,942 bilhões.

Esse faturamento era dividido da seguinte forma: 

  • R$ 10,036 bilhões de lojas físicas;
  • R$ 12,313 bilhões em operações digitais;
  • R$ 17,593 bilhões com parceiros (marketplaces).

Enquanto isso, de janeiro a setembro de 2022, a empresa teve um prejuízo líquido de R$ 447 milhões, acima dos R$ 68 milhões do mesmo período de 2021.

Mais grandes números – antes da crise (3º trimestre de 2022):

  • 53 milhões de clientes ativos;
  • 1,7 bilhão de itens vendidos;
  • 487 milhões de transações;
  • 149 mil sellers (marketplaces);
  • 3,6 mil lojas, sendo 1,8 mil Americanas;
  • 1,4 milhão de m² quadrados de áreas de vendas.

Marcas – antes da crise (3º trimestre de 2022)::

  • Americanas; Submarino, ShopTime, Ame Go, Hortifruti Natural da Terra, Uni.co; Vem Conveniências (faria na BR Mania).

Ainda é cedo para saber qual será o futuro da Lojas Americanas. Mas o certo é que a empresa, referência do varejo, não será mais a mesma.

(Cândido Mendes)